Sabedoria antiga por Tom Morris

SABEDORIA ANTIGA

por Tom Morris

( professor de Filosofia da Universidade de Notre Dame, escritor americano, Doutor em Filosofia e Estudos Religiosos pela Universidade de Yale)

 

Quer preparar-se para o futuro? Aprenda com o passado. É lá que estão as mais profundas verdades da natureza humana 

Durante milhares de anos, os filósofos tentaram compreender a natureza humana e procuraram a sabedoria sobre a melhor maneira de viver. Os mais brilhantes fizeram descobertas profundas sobre a excelência e sobre o sucesso, que resistiram ao teste do tempo. 

Mais do que nunca, em toda a história da humanidade, precisamos de sabedoria sólida. O ritmo das mudanças é o mais rápido desde sempre. E o futuro acena-nos com uma aceleração ainda maior em termos de inovação tecnológica, globalização e reconfiguração do modo como trabalhamos e competimos em todas as atividades. Somente tomando como base as mais profundas e imutáveis verdades sobre a natureza humana estaremos aptos a lidar com todas as coisas mutáveis à nossa volta. Acredito que muitos aspectos da antiga sabedoria nos podem preparar para tirar o máximo proveito das oportunidades de negócios com que o futuro nos brindará. 

O papel do autoconhecimento

Na Antiguidade, muitas pessoas procuravam os conselhos do filósofo Tales. Em resposta à questão: «Qual a coisa mais difícil do mundo?», ele dizia, simplesmente: «Conhecer-se a si mesmo.» Quando lhe perguntavam: «Qual a coisa mais fácil do mundo?», Tales replicava: «Aconselhar as outras pessoas.» E, quando lhe colocavam a questão: «De todas as coisas, qual a que causa maior satisfação?», o filósofo respondia: «O verdadeiro sucesso.»

Trata-se de uma série de intuições iluminadoras. A coisa mais fácil do mundo é dar conselhos. Mas bons conselhos, ironicamente, são difíceis de encontrar. Os que se aproximavam de Tales para colocar as suas questões sobre a vida faziam bem em procurar um especialista em natureza humana. E o filósofo não os desapontava. 

Tales estava certo em cada uma dessas respostas. Todos os pensadores antigos recomendavam insistentemente aos seus ouvintes a necessidade de se autoconhecerem. Mas o autoconhecimento pode ser a coisa mais difícil de atingir e de ser renovada. E, no entanto, pode-se afirmar que é o fundamento mais importante para o que dá mais satisfação, que é o verdadeiro e duradouro sucesso. É por esse motivo que o sucesso representa um desafio tão grande nos negócios e na vida. Sem autoconhecimento, pessoas talentosas e habilidosas estão desprovidas de um dos alicerces mais básicos do sucesso duradouro. 

Todo o trabalhador no século XXI precisará de se ver a si próprio como um empresário independente, um vendedor especializado de serviços com uma marca conhecida de todos. Só isso nos ajudará a atrair recursos, respeito e oportunidades que manterão o trabalho interessante, a empresa poderosa e a carreira florescente. E isso requer uma grande dose de autoconhecimento. 

Os requisitos do sucesso

O verdadeiro sucesso nos negócios e na vida envolve três coisas: descobrir os nossos talentos, desenvolvê-los e utilizá-los tanto para o bem alheio quanto para o próprio bem. A essência do sucesso não reside em dinheiro, fama, poder, status, quota de mercado ou lucro. Esses são meros efeitos colaterais contingentes do verdadeiro sucesso. A substância do sucesso envolve sempre autoconhecimento, crescimento pessoal e atividade num nível de excelência que produz grandes relacionamentos e resulta em algo positivo para o mundo. O verdadeiro sucesso Reflete-se, em geral, nesses parâmetros externos, que muitas vezes buscamos obsessivamente. Mas nunca é encontrado quando só os procuramos a eles. 

No meu livro True Success: A New Philosophy of Excellence, apresento sete condições universais de sucesso como elas eram entendidas pelos maiores filósofos de todas as culturas, desde os tempos mais remotos. Em cada desafio é preciso estruturar as nossas ações e atitudes em torno delas. Em todas as empresas, precisamos de: 

  • Uma clara concepção do que queremos; 
  • Uma forte confiança de que podemos atingir o nosso objetivo; 
  • Uma concentração focalizada no que faremos; 
  • Uma consistência obstinada na busca do que almejamos 
  • Um compromisso emocional com o que estamos a fazer; 
  • Um bom caráter, para nos guiar e manter no caminho; 
  • Uma capacidade de desfrutar do processo. 

O sucesso em qualquer empreendimento é bastante facilitado quando essas sete condições são seguidas. Por mais importantes que tenham sido no passado, estou convencido de que serão ainda mais vitais para o sucesso nos negócios no futuro. 

A importância das pessoas 

O sucesso duradouro nos negócios baseia-se na compreensão e no respeito das necessidades universais da natureza humana. Os filósofos antigos diagnosticavam com especial ênfase os motivos profundos que nos levam a dar o melhor de nós próprios em cada situação. E deixaram-nos os mais diversos tipos de conselhos sobre o que realmente importa em qualquer atividade humana. Tendemos, com frequência, a pensar nos negócios em termos de produtos e processos, mas é um terceiro elemento que acaba sempre por ser o mais importante — as pessoas que fazem o trabalho. Processos eficientes e produtos de qualidade são vitais para qualquer companhia que quiser ser bem sucedida. Mas a fonte e o fundamento real do sucesso duradouro é, em última instância, o espírito das pessoas envolvidas. 

Muitos dos antigos filósofos compreenderam que há quatro dimensões da experiência humana que estruturam tudo o que sentimos e fazemos. Se pudermos apreender a importância desses quatro fundamentos, podemos acumular mais energia para os nossos fins empresariais. As pessoas precisam de uma certa dose de verdade, beleza, bondade e unidade na sua experiência diária de trabalho. Se respeitarmos e alimentarmos esses quatro preceitos em todas as nossas relações com as pessoas, criaremos nas nossas organizações um espírito de corporação mais forte e novas formas de lealdade — que não dependem unicamente de condições imprevisíveis do mercado —, tanto no interior das nossas companhias quanto com os vendedores e clientes. Ao seguir esses princípios, alcançamos as raízes profundas da motivação humana e fornecemos as condições para manter o sucesso em tudo o que fazemos. O futuro dos negócios exigirá que compreendamos essas intuições, que são as mais antigas, e as apliquemos em tudo o que fizermos. 

A liderança na mudança

O poema épico Beowulf, escrito no século VIII d. C., está recheado de intuições sobre liderança e advertências para realizadores de grandes feitos. 

Segundo o relato, Beowulf tornou-se o mais completo guerreiro da sua época, vencendo os inimigos mais fortes. A sua reputação estabeleceu-se por séculos quando, ainda jovem, venceu dois monstruosos inimigos sozinho. Como resultado da sua força, bondade e honestidade, governou o seu povo durante 50 anos. O seu reino foi então repentinamente ameaçado por um horrível dragão que cuspia fogo. 

Diante do maior desafio da sua carreira, Beowulf reuniu uma dúzia de homens para o acompanhar ao covil do dragão, mas levou-os como testemunhas, não como companheiros de armas. O seu orgulho e os seus hábitos, há muito arraigados, determinaram que ele tentasse lutar sozinho com o adversário. A violência da luta foi tão grande que os espectadores fugiram, apesar de serem soldados experimentados. O seu líder nunca os preparou para enfrentar os mais exigentes desafios — sempre tratou sozinho das grandes tarefas. Assim, quando o maior de todos os testes surgiu, eles não estavam preparados para ajudar. Exceto um jovem, Wiglaf, que permaneceu e lutou a seu lado. Juntos, «em parceria», diz o poeta, derrotaram o dragão, mas Beowulf foi mortalmente ferido. 

Este grande homem encontrou a morte porque não foi capaz de mudar quando era necessário. Nada garantia que o que funcionou na sua juventude funcionaria na velhice. Mas ele era orgulhoso. E tinha hábitos que o fizeram agir de uma maneira quando outra era a mais apropriada. 

Isso deveria servir de aviso para todos nós. O que funcionou no passado nem sempre se revelará a melhor estratégia no futuro. Não podemos deixar que os nossos hábitos e orgulho impeçam a abertura e a mudança. Precisamos do autoconhecimento para evitar que nos transformemos nos nossos piores inimigos em tempos de mudança. 

A lição final de Beowulf é que nenhum de nós pode fazer as coisas mais importantes sozinho. A parceria, a colaboração e a aliança são as chaves para enfrentar os mais assustadores desafios com que nos defrontamos. E o futuro dos negócios exigirá isso. 

REFERÊNCIA

MORRIS, Tom. Sabedoria Antiga. Você S/A. São Paulo: Editora Abril, ago. 2000.

COMENTÁRIO de Kathy Marcondes:

Antiguidade não é sinônimo de velhice ou caduquice. Não quer dizer sabedoria ou vitória. Antiguidade requer avaliação cuidadosa. É um convite ao aprofundamento: por que o antigo chegou até aqui? como o antigo chegou até mim? para que essa antiguidade é preservada e recontada? Perguntar… nunca ofende.